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Barbara Guatimosim

Para Blanchot, é nessa região que erra o topógrafo

d‘O castelo, que desde o começo está —”fora do alcance da

salvação, pertence ao exílio, esse lugar onde não só não está

em sua casa, mas está fora de si.” (BLANCHOT, idem, p.

72.)

A terra de erro em que Kafka vagueia deixa-o

fora do mundo, onde ele se sente “apenas flutuando em

algum limbo.” (Carta a Felix Weltsch de 10/1913. In:

KAFKA. Cartas aos meus amigos, p. 26). Uma condição

zumbi, nem morto, nem vivo, que o faz pensar na morte

como uma redenção. Esta fantasia de renascer ao cabo

de um banimento absoluto prolifera nos escritos, o que

alguns vêem como alusão à mentepsicose cabalística:

(BLANCHOT, 1987, p. 65 [nota]). “Se existe uma

transmigração das almas, então eu não me encontro ainda

no último degrau (unterstenStufe).” (KAFKA. Diários,

Difel, 24/01/1922, p. 360). Mas nessa fantasia vemos bem

mais a esperrânsia de uma segunda morte, morte que lhe Angústia

traga a chance de uma outra vida.

Mas se a segunda morte tão ansiada não lhe vem

em socorro, melhor contar com a primeira. Kafka cortejou-a

por muito tempo. Depois do fracasso de seus dois noivados

no afã de unir-se a uma mulher e formar uma família, sem

conseguir afirmar-se como homem e escritor, desabafa

com seu amigo Max Brod: “— Por que tantas paradas na

estrada para a morte? Por que leva tanto tempo?” (Kafka

em lamento a Brod apud PAWEL. O pesadelo da razão, p.

Revista da ATO – escola de psicanálise, Belo Horizonte, Inibição, sintoma, angústia, Ano II n. 1, pp. 59-68, 2016 61
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