Page 16 - Revista ATO Ano 4 N 4
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A economia pulsional, o gozo e sua lógicaDe um resto que ainda resta: o traço e a lógica

os tempos, ao lado, por exemplo, da chegada do homem à
Lua, embora a expedição tenha fracassado em seu objetivo.

O Endurance ficou preso no gelo do Mar Weddell e perma-
neceu à deriva durante todo o inverno antártico de 1915. E,
por fim, no dia 27 de outubro, do mesmo ano, o gelo esma-
gou o navio que se desintegrou completamente. Seus 28
tripulantes, que abandonaram o navio antes de se afundar,
tornaram-se náufragos na escuridão gelada de meses, sub-
metidos ao frio de -50oC, envoltos nas roupas constante-
mente molhadas, com escassa provisão e, por isso mesmo,
se alimentando de focas e pinguins. Eles tentaram encon-
trar insistentemente uma rota de fuga em botes e foram
resgatados finalmente em janeiro de 1917. O ápice dessa
façanha de mais de 500 dias é o fato de que todos os 28 ho-
mens sobreviveram.

Lacan recorre a essa aventura para falar do traço unário,
considerando:

Portanto, a abordagem que escolhi, com a segunda forma de
identificação, não foi ao acaso; é porque essa identificação
é apreensível, sob o modo de abordagem pelo significante
puro, pelo fato de que nós podemos apreender de uma ma-
neira clara e racional uma via para entrar no que quer dizer a
identificação do sujeito, enquanto este faz surgir no mundo
o traço unário. [...] antes que o traço unário, uma vez desta-
cado, faz aparecer o sujeito como aquele que conta – no du-
plo sentido do termo. A amplitude da ambiguidade que vo-
cês podem dar a essa fórmula ‘aquele que conta’, ativamente
sem dúvida, mas também o que conta, exatamente o tempo
que levaremos para percorrer tudo o que acabo de lhes in-

16 Revista da ATO – escola de psicanálise, Belo Horizonte, ano 4, n. 4, p. 13-27, 2018
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