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Transferência na clínica em cidade pequenaReal da experiência

A clínica em cidade pequena é problemática de muitos e
curiosidade de outros, uma vez que toca no lugar do ana-
lista, na técnica e no uso clínico da metapsicologia. Por ci-
dade pequena compreendamos aquela do interior, onde o
ritmo repetitivo e estreito faz com que o analista encontre
seu paciente fora da clínica várias vezes. As cidades peque-
nas, mesmo as próximas das capitais e as cidades com alto
índice de população, têm um teor de repressão – Unter-
drückung – diferente, um trabalho da cultura distinto, que
merece escuta e atenção flutuante. Lá, em geral, ainda se
reprime, com mais intensidade, coisas que, na capital, já
estão mais naturalizadas nas relações. A título de exemplo,
como dão notícias da vida do outro no interior, em cidade
pequena, um namorado dormir na casa de uma namorada,
sem que a união tenha sido oficializada, é o cúmulo do ab-
surdo.

No campo do atemporal do inconsciente, ocorre nitida-
mente a marca de que o psicanalista cresceu na cidade
como ser humano. E a isso chamarei, mediante prática
clínica, de suposto saber distorcido ao suposto conhecer.
Muitos dos que procuram o analista – que ali morou desde
criança e que é “o filho de” – se referenciam na confiança
clínica pelo julgo imaginário da família de onde veio e pelo
histórico de conduta.

Dessa forma, o procuram na suposição de conhecê-lo como
analista. Para alguns, esse conhecer, que é não todo, pode
ser ponto de desistência, outro vértice da transferência, ou
seja, a resistência máxima, o rompimento.

118 Revista da ATO – escola de psicanálise, Belo Horizonte, Topologia e desejo do analista, ano 3, n. 3, p. 117-126, 2017
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