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efeitos da transmissãoLer, escrever e... Se reinventar

O que fazer com essas marcas, restos ou rastros
deixados pelo caminho de uma análise?

É preciso tratá-los como letras de gozo que se
ordenam segundo a teoria matemática dos conjuntos.

Tais conjuntos são formados pelos restos de
significantes que insistem e se repetem infinitamente,
embora não conectados à cadeia de significantes. Isso é que
ele chama de escrita do gozo, que é uma forma de bordejar
a estrutura. Freud tratou disso em termos de trilhamentos,
traços de percepção, dentro de uma perspectiva neurológica.
Mas ele falou também de transcrições e re-transcrições na
Carta 52. O analista opera como um caçador no deserto,
seguindo os rastros deixados pela queda dos objetos na
análise, destituição subjetiva que vai cavando os furos do
simbólico.

Tais furos, entretanto, não são apenas efeitos
do simbólico. Existe um campo de um real que nunca
entrou no simbólico e que se traduz pela impossibilidade
de se escrever a mulher no inconsciente. Lacan fala disso
por meio de aforismos: falta um significante no campo do
Outro, a mulher não existe, a relação sexual não existe.

Sabemos que a mulher é não toda significante.
Ela é tomada como significante em sua função de mãe, por
exemplo. É como mãe que a mulher entra na linguagem no
discurso corrente. Esse gozo em que ela é não toda, implica
que, em algum lugar, ela está ausente de si mesma, ausente
como sujeito, exilada de si, e é deste lugar de ausência de

170 Revista da Ato – Escola de psicanálise, Belo Horizonte, Angústia, Ano I n. 0, pp. 167-177, 2015
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