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efeitos da transmissãoLer, escrever e... Se reinventar

cidade natal e reencontra as velhas tias e vizinhas, mulheres
com as quais se reúne todas as tardes e, sentadas nas cadeiras
nas calçadas, conversam e tecem. Assim, passam os dias
falando e tecendo, até que numa manhã ela acorda, pega suas
coisas e retorna retomando o fio de sua vida.
Parece que estamos falando da própria experiência analítica,
desse espaço-tempo-fora, que Lacan chamou de ex-sistência,
em que só nos resta falar e tecer cercando o buraco que se
abre em momentos privilegiados de uma análise em que
nos deparamos com o vazio de nossa própria estrutura e nos
perguntamos o que fazer quando nenhuma palavra serve,
quando nenhuma interpretação tem efeitos, quando a cadeia
em que nos ancorávamos vacila e já não nos sustenta mais
como antes. Resta-nos, quem sabe, fazer como a personagem
do filme – habitar por um tempo lógico esse campo vazio
do feminino –, onde só se pode falar e tecer, uma fala em
que a linguagem não tampona e, sim, promove efeitos como
se acompanhasse as mãos, tecendo a rede que pode conter
nosso ser de falta (VAZ RODRIGUES, 2013, p.15).

Transportemo-nos à cena analítica e ao discurso

do analista. Tal discurso é introduzido por meio do ato do

analista, que, por sua vez, promove a entrada em análise

pela abertura do inconsciente. A partir de então, aprende-

mos a ler o inconsciente, pois, o inconsciente é estruturado

como uma linguagem. Essa leitura se faz articulando-se

uma cadeia de significantes que se ordena segundo a lei

simbólica.

A leitura do inconsciente vai extraindo, a partir

da fala do analisante, o ponto de repetição que toca na ques-

tão de cada um. Lacan, em seu seminário Encore, livro 20,

trata disso ao se referir à dimensão da tolice do inconscien-

te, na medida em que, pela associação livre, demandamos

168 Revista da Ato – Escola de psicanálise, Belo Horizonte, Angústia, Ano I n. 0, pp. 167-177, 2015
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