Page 69 - Revista ATO Ano 4 N 4
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Maria Luiza Bassi

Essa elaboração das resistências pode, na prática, revelar-se A economia pulsional, o gozo e sua lógica
uma tarefa árdua para o sujeito em análise e uma prova de
paciência para o analista. Todavia, trata-se da parte do tra-
balho que efetua as maiores mudanças. Pode-se correla-
cioná-la com a ‘ab-reação’ das cotas de afeto estranguladas
pelo recalque (FREUD, v. 12, 1914, p. 203).

A brincadeira do neto de Freud com um carretel, dizendo
as palavras Fort-Da, sempre que a mãe se ausentava, nos
diz de uma escansão que força um significado.

A hiância introduzida pela ausência desenhada, e sempre
aberta, permanece causa de um traçado centrífugo no qual
o que falha não é o outro enquanto figura em que o sujeito
se projeta, mas aquele carretel ligado a ele próprio por um
fio que ele segura – onde se exprime o que, dele, se destaca
nessa prova, a automutilação a partir da qual a ordem da sig-
nificância vai se pôr em perspectiva. Pois o jogo do carretel é
a resposta do sujeito àquilo que a ausência da mãe veio criar
na fronteira de seu domínio – a borda do berço – isto é,
um fosso, em torno do qual ele nada mais tem a fazer senão
o jogo do salto (LACAN, 1964, p. 63).

O gozo aparece exibido na transferência. É com ela e a par-
tir dela que o analista vai operar, criando ali uma região
intermediária, uma hiância, um espaço entre a presença e
a ausência, possibilitando “o jogo do salto” em direção ao
desejo, remédio para o gozo.

Um paciente de 22 anos procura análise por estar “em uma
crise de pânico”. Faz referência a pensamentos repetitivos
sobre a morte e o tempo: o meu tempo de morrer vai che-
gar, o que vou fazer quando tiver 60 anos? Meus pais já
estão perto da morte. Esses pensamentos o acossam, não o

Revista da ATO – escola de psicanálise, Belo Horizonte, ano 4, n. 4, p. 61-71, 2018 69
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