Page 67 - Revista ATO Ano 4 N 4
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Maria Luiza BassiA economia pulsional, o gozo e sua lógica

Ainda em 1964, Lacan comenta o texto “Gjentagelsen” de
Soren Kierkegaard, “o mais agudo dos questionadores da
alma humana antes de Freud” (LACAN, 1964, p. 62). A re-
ferida novela kierkegaardiana, editada em outubro de 1843,
expressa uma história de amor e levanta as seguintes ques-
tões: ‘uma repetição é possível? Que significação ela teria?
Uma coisa ganha ou perde ao se repetir?’. Essas questões
atravessam toda a novela.

O prefixo Gjen do texto “Gjentagelsen” significa “de novo”
e o restante da palavra é um substantivo forjado sobre o
verbo at tageque que significa “tomar”. Dessa forma, a
melhor maneira de reproduzir seria reprise, ou retomada.
Kierkegaard usou esse termo para evitar qualquer referên-
cia à palavra latina repetição que quer dizer “o mesmo no
mesmo”, enquanto a Gjentagelsen marca o surgimento do
novo.

Podemos concluir que repetição está ligada a uma impos-
sibilidade de representação, encontro sempre faltoso re-
lacionado ao ponto de gozo na estrutura. O sujeito nun-
ca encontra o que procura, por isso repete de uma forma
compulsiva. Movimento contínuo da pulsão em busca de
satisfação, marca de um excesso que acossa o sujeito, traz
sofrimento.

Recebemos em nossa clínica esses sujeitos transbordados
de gozo, tomados pela angústia, muito característico das
crises histéricas e da psicose, ou seja, o resto pulsional que
invade o sujeito.

Revista da ATO – escola de psicanálise, Belo Horizonte, ano 4, n. 4, p. 61-71, 2018 67
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