Page 113 - Revista ATO Ano 4 N 4
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Raul Macedo RibeiroA economia pulsional, o gozo e sua lógica
Para além desses saberes fundamentais que fundam a psi-
canálise, o que há de fundamental no campo da clínica psi-
canalítica é o ato de silenciar para dar voz àquele que fala.
É, pois, no campo do silêncio e da voz – silêncio e voz tanto
do analista quanto do analisante – que se estrutura o cená-
rio onde ambos, cada um a seu modo, com seus respectivos
saberes e ignorâncias, realizam seus trabalhos.
Foi no enquadre do silêncio e da voz que, em outro caso
clínico, o significante “descobrir” se interpôs na cena ana-
lítica. Isso se deu a partir de um relato de sonho: Ela vai
descobrir que eu estava aqui, e, para fugir de ser descober-
ta, pula uma janela e surge nua em uma rua da cidade na
qual se casara há mais de vinte anos. Nua da cintura para
baixo, diz a analisante. Foi assim que a palavra “descobrir”
se impôs como um significante que apontava para a nudez
escondida de uma mulher que insistia em se manter ina-
cessível, portanto, apartada da possibilidade até mesmo de
um gozo sexual.
Que a relação sexual seja algo impossível é o que passamos
a repetir, em verso e prosa, com Lacan. No entanto, o poeta
Manuel Bandeira, em sua poesia “A arte de amar”, escreve
o seguinte:
Se queres sentir a felicidade de amar, esquece tua alma. / A 113
alma é que estraga tudo. / Só em Deus ela pode encontrar
satisfação. / Não noutra coisa. / Só em Deus – ou fora do
mundo. / As almas são incomunicáveis. / Deixa o teu corpo
entender-se com outro corpo. / Porque os corpos se enten-
dem, mas as almas não. (BANDEIRA, 2006, p. 65).
Revista da ATO – escola de psicanálise, Belo Horizonte, ano 4, n. 4, p. 111-118, 2018
Para além desses saberes fundamentais que fundam a psi-
canálise, o que há de fundamental no campo da clínica psi-
canalítica é o ato de silenciar para dar voz àquele que fala.
É, pois, no campo do silêncio e da voz – silêncio e voz tanto
do analista quanto do analisante – que se estrutura o cená-
rio onde ambos, cada um a seu modo, com seus respectivos
saberes e ignorâncias, realizam seus trabalhos.
Foi no enquadre do silêncio e da voz que, em outro caso
clínico, o significante “descobrir” se interpôs na cena ana-
lítica. Isso se deu a partir de um relato de sonho: Ela vai
descobrir que eu estava aqui, e, para fugir de ser descober-
ta, pula uma janela e surge nua em uma rua da cidade na
qual se casara há mais de vinte anos. Nua da cintura para
baixo, diz a analisante. Foi assim que a palavra “descobrir”
se impôs como um significante que apontava para a nudez
escondida de uma mulher que insistia em se manter ina-
cessível, portanto, apartada da possibilidade até mesmo de
um gozo sexual.
Que a relação sexual seja algo impossível é o que passamos
a repetir, em verso e prosa, com Lacan. No entanto, o poeta
Manuel Bandeira, em sua poesia “A arte de amar”, escreve
o seguinte:
Se queres sentir a felicidade de amar, esquece tua alma. / A 113
alma é que estraga tudo. / Só em Deus ela pode encontrar
satisfação. / Não noutra coisa. / Só em Deus – ou fora do
mundo. / As almas são incomunicáveis. / Deixa o teu corpo
entender-se com outro corpo. / Porque os corpos se enten-
dem, mas as almas não. (BANDEIRA, 2006, p. 65).
Revista da ATO – escola de psicanálise, Belo Horizonte, ano 4, n. 4, p. 111-118, 2018